quinta-feira, 9 de abril de 2015

09.04.2015 O valor das coisas

Ontem a noite resolvi xeretar a coleção de moedas que herdei do meu falecido avô. A coleção pelo sei foi dividida em duas, metade pra mim e metade pro meu irmão. [Um dia ainda vou convencer meu irmão de me dar a parte dele] Das moedas que ficaram comigo a mais velha que achei foi essa de 50 centavos que data de 1943. Tá até meio surradinha, mas tento manter o aspecto "original" delas e não mexo muito. Guardo elas nessa caixinha onde até a estampa é de moedas antigas, a caixa veio junto de uma das várias carteiras que já dei de presente ao meu pai quando era mais nova. Enfim, por mais que uma moeda fora de uso e ainda no valor de "50 centavos" aparentemente nem se tenha lá muito valor, pra mim isso ai é como se fosse um tesouro. Não só por ser antigo, colecionável, mas por ter vindo do meu avô, por ter tido um significado, foi algo que fez parte da vida dele. O que acho bacana é que no meio de tantas moedas posso ver como elas foram mudando ao longo do tempo, e o mais legal é descobrir algumas coisas sobre meu avô meio que indiretamente. Perdidas no meio das moedas brasileiras achei moedas argentinas, de épocas diferentes até, onde os modelos variam e datam de 1947 a 1954. Meu avô também colecionava notas e eu me encarreguei de cuidar delas. Por lá também há uma nota argentina, un peso. Tenho certeza de que meu avô viajou para lá e tenho impressão de que foi mais de uma vez. Infelizmente isso é algo que só posso basear em algumas deduções já que isso ocorreu antes do meu pai nascer e minha avó paterna também já é falecida. E porque o fato do meu avô viajar pra um país vizinho me fascina tanto? Primeiramente porque sou louca pra viajar pra Argentina rsrs, segundo porque eu sei que meu avô foi um aventureiro. Ele demorou a casar e creio que suas aventuras foram responsáveis por isso. Aqui em casa tenho fotos dele bem antigas, de cartões postais em preto e branco de algumas praias, e inclusive do Rio de Janeiro, onde suspeito que ele tenha ido mais de uma vez também. O mais intrigante de tudo é que no período onde ele passou a morar em casa, foram cerca de 10 anos, ele era de falar pouco, sempre muito reservado. E eu vivi com ele sem nem imaginar a porção de coisas magnificas que ele fez em vida. Abril é um mês difícil pra mim, pois no dia 23 fará 8 anos que ele se foi. Ele era uma pessoa meio alheia as coisas, ele não era comum, tudo nele era peculiar. Meu avô teve uma infância difícil pois seus pais morreram bem cedo e foi criado pela irmã [que aliás por pouco não chegou aos 100 anos] talvez isso deva ter influenciado no seu jeito de ser, distante e um tanto desajeitado socialmente. Infelizmente eu era criança demais para poder perceber a pessoa incrível que eu tinha em casa. Sinto que realmente desperdicei a chance de conhecê-lo de verdade. Hoje com a cabeça menos oca eu certamente viveria enchendo as paciências perguntando sobre a vida dele, afinal pense bem, meu avô por pouco não viveu um século inteiro, ele acompanhou tanta coisa, o início e o fim da segunda guerra mundial, o surgimento a televisão, o homem pisando na Lua, as mudanças na moda, a ditadura militar, os estilos musicais que foram surgindo [lembro dele me contando como foi o choque ao surgir o rock'n roll rsrs], os computadores e telefones celulares... sem contar as coisas que ele viveu, era um homem absurdamente inteligente. Mas guardou suas experiências pra si. Eu costumo dizer que só vim a conhecê-lo após a morte. E não foi por psicografia rsrs, na realidade pode até ser um pouco de "perder pra dar valor", mas creio que só quando amadureci, algum tempo depois que ele se foi, é que fui notar o valor das coisas. Ele tinha uma estante repleta de livros, hoje a maior parte deles está comigo. Sinto que posso conhecer ele através dos seus interesses, como se fossem pistas da pessoa que ele era. Seria tudo mais fácil se ele tivesse escrito um diário, facilitaria muito, mas eu gosto de descobrir meu avô assim indiretamente. Hoje vejo que temos muito em comum. Sempre me lembrarei daquelas letras distorcidas pelo parkinson, que me fascinavam, os olhos verdes bem clarinhos um tanto vesguinho no estilo Pc Siqueira, e aquele cabelo liso e branco perfeitamente alinhado. O jeitinho atrapalhado de ser, seu modo de andar, sua mania de contar moedas, o seu tipico lugar no sofá da sala onde costumava ler seu jornal. Sua paciência ao me corrigir quando eu aprendia as tabuadas. Nunca me esquecerei do dia magnifico em que foi comigo num parque, me acompanhou nos brinquedos e que ao descer no tobogã de nem sei quantos metros já com seus mais de 80 anos virou a sensação do lugar. Realizou todos os meus desejos fazendo dos meus natais, aniversários e dia das crianças os melhores possíveis. Suas roupas bem estilo vovô que lhe deixavam sempre elegante. Os anos novos nunca mais foram os mesmos sem suas tipicas boas festas onde ele juntava [as já em desuso] notas de um real o ano inteiro pra distribuir pros meus primos no primeiro de janeiro. Sempre foi marcado pela sua bondade, foi triste vê-lo chegar ao fim. Creio que meu maior arrependimento é não tê-lo amado mais enquanto tive a oportunidade. Mas fico feliz de saber que as cartinhas que eu escrevia pra ele ainda estavam bem guardadas. Achei uma que é de pouco tempo antes dele vir a ficar doente, fiquei aliviada de conseguir ter escrito tudo o que eu sentia, ele disse a minha mãe que não merecia tudo aquilo, mas a realidade é que ele merecia era muito mais do que eu pude oferecer.       

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